DE REPENTE É NOITE E O MONSTRO SOBRE MINHA CAMA

 

         A decisão de levar alguém para a cama não deve ser leviana. Mesmo que seja um encontro casual, é preciso que ele valha a madrugada em claro, para depois, quando denunciados pela luz do dia, possamos cochilar satisfeitos e transgressores em nossos enfadonhos postos de trabalho.

 

         Nos últimos dias, finalmente, tive a coragem e o tempo necessários e levei Maik Wanderson para a cama. Sim. É preciso coragem ao fazê-lo, pois seu livro De repente é noite não é feito para nos distrair, possui o fim declarado de nos provocar. Defini que o leria à noite a fim de me aproximar da proposta do título. A decisão foi acertada, pois se trata de um trabalho redigido com tintas de escuridão real e pinceladas de luzes artificiais.

 

         Li um capítulo por noite, o que me rendeu exatos sete dias de confronto, não com os monstros que vivem sob minha cama, mas com aquele que deitei sobre ela, totalmente despido, páginas abertas.

 

         Em determinada passagem de seu intrigante livro, Maik Wanderson nos alerta que “não se pode escolher impunemente”. Hoje, enquanto escrevo esta resenha, sinto quer pago o preço por minha ousadia. Não se pode ler De repente é noite e fechar o livro sobre o peito sem que sintamos seu peso. Eu escolhi conhecer suas personagens e agora percebo que aquela solidão também é minha, que ser da companhia muitas vezes não passa de uma ilusão, de um tolo eufemismo existencial.

 

         De repente é noite é uma obra para ser lida com o corpo inteiro. Há algo de sensorial em suas entrelinhas, estímulos que nos arrancam de nossa cômoda posição de leitor, atirando-nos à melancolia e ao ostracismo de personagens criadas para fazer rachar o verniz social feito para nossa proteção, e que tanto nos esfola as carnes.

 

         Levem Maik Wanderson para a cama. É gozo garantido!

 

 

Emerson Braga

 

quarta-feira, 08/08/2017

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